Um mau bocado estamos todos nós a passar nos tempos que correm. Por isso, a música do Zeca, uma balada muito antiga e muito actual, o "Coro dos Caídos", que fui descobrir na minha colecção de mp3...

Os versos são, obviamente, "datados". Apesar disso e do mais, apetece-me pô-los aqui hoje.
Para a Wind e para todos quantos queiram lê-los.
Arroz Doce, Amêndoa Amarga
no vago da aurora nas ondas nas cores nos canais
construir calmamente criar num minuto num ano
numa vida de vida os caminhos abrir horizontes
com os olhos que damos e as mãos de fumo perdidas
e o silêncio que fica povoarmos de risos ou facas
ou tímidas aves ou cores ou canais de mãos dadas
nas sombras do espanto onde a líquida rosa desperta
com o corpo na pedra assinarmos o nome que marca
dos frescos países onde as brisas se encontram a sós
onde os lábios se abrem ao ritmo do tempo das plantas
e nas veias as facas e os risos de novo se cruzam
na paisagem do dia que temos na data do amor
como seremos ao sermos no devir das formas que
a cada instante se inventam à superfície do espelho
em que nos vemos ser vagos seres com plantas nos lábios
sem antes dizermos descoberto o descobrir que temos
os caminhos do corpo as estradas de cada cabelo
com os dedos salgados tocando intranquilos as coisas
com os dedos nervosos formando o futuro da carne
e o que se diz alma à solta ao que há-de vir aos ventos
de rios por rios com estátuas de vidro nas margens
circulantes poeiras de luz vinhos de corpo espesso
e tudo bebermos com a ânsia dos outros de nós
e tudo em nós ser bálsamo ou sábio alimento
Criar a aventura o sabor dos mais antigos frutos
com as mãos que nos unem e os olhos de fumo que temos
pedra a pedra ir erguendo as cidades do amor impensável
no corpo a corpo em que o sangue silencia o eterno medo
rompe as muralhas e corre em direcção ao sol que dentro
no canto vagabundo que recusa a solidão o nada
na invencível revolta na terna manhã das entranhas
no prazer da terra agora da terra vestida despida
no prazer da nudez absoluta serena de braços abertos
Viver sem fronteiras um hoje em que a luz nos beija o peito
ser o mar e a areia e os bosques e os barcos e os remos
sem guardar as palavras sem adiar a música dos gestos
viver como a líquida rosa que pouco a pouco se abre
e abrindo-se inteira se dá e em se dando desperta
com os olhos que damos perdidos nas mãos que esquecemos
corpo a nascer das águas vertical puro e molhado
e é preciso que hoje respire uma lágrima um beijo
braços abertos de amor que espera e dói - e tanto basta