Aliencake

Foi numa tarde de sábado, de encontros, reencontros e desencontros, de estreia literária e café, tudo prolongado em noite, jantar e mais café, ficando no entanto curto o tempo. De súbito, aparece-me pela frente um bolo com a minha cara. Um bolo com rosto de Alien. Olhei-o uma e outra vez, e só não me belisquei porque dói um bocado, convenhamos. Mesmo a aliens. As pessoas cantavam os parabéns e batiam palmas, eu ouvia e agradecia, mas mal tirava os olhos do bolo. Fizeram-me pegar nele com uma mão, perante a apreensão de alguns circunstantes, e conduzi-lo, ou deixar que me conduzisse, à mesa improvisada. Vivendo desde sempre em terrível dúvida sobre a minha origem e condição, houve um instante luminoso em que tudo se revelou. "Sou um bolo, afinal sou um bolo!" - exclamei para mim mesmo, entre alguma perplexidade e o alívio de uma certeza há muito tempo aguardada. Foi sol de pouca dura. Lá tive que partir o bolo. Lá tive que me cortar à faca em fatias que rapidamente desapareceram. Ao que parece, estava bom, eu. O facto é que, apesar disso, ainda estou vivo. Não serei, então, um bolo? Serei apenas a recordação dele? Felizmente, a fotógrafa estava lá. Serei assim talvez a fotografia de um bolo. Há piores destinos. Há piores fins de tarde-noite de sábados de lançamentos de livros, encontros, reencontros, desencontros, jantares, cafés, aniversários e ainda mais. Muito, muito piores, garanto-vos.

24 de mai. de 2007

Que farei com este blog?



Enquanto os dias cavalgam soletram se riem geometricamente colocados no centro da aparente voragem viagem imagem,

enquanto os traços permanecem oblíquos e no entanto se mudam reordenam ziguezagueiam e dançam,

enquanto as coordenadas simpatizam olham de soslaio os eixos os seixos os fechos e abrem e prometem e cercam e cerram,

enquanto as cores que há se multiplicam pelos nadas e as notas das inúmeras escalas se soltam e chamam e de tudo isso parece nascer um canto uma prece um sorriso,

enquanto as palavras discretas me fogem retiram cansadas quem sabe para que vãos para que dias para que sóis e os dedos se tornam vazios de espera e quase gritam de medo,

enquanto.